Internet "brasileira" Livre de espionagem, será possível?
O Brasil pretende investir em conectividade com a Europa para reduzir a dependência brasileira nos cabos de fibra ótica que passam pelos Estados Unidos e também está sendo avaliada uma legislação para que dados de brasileiros em sites como Google e Facebook sejam armazenados em território nacional.
O objetivo seria evitar a espionagem norte-americana nas comunicações brasileiras. Há, porém, uma falha nesse plano: nem todos os métodos de coleta de dados da Agência Nacional de Segurança (NSA) dos Estados Unidos são legais.
A NSA obtém autorização judicial para realizar coleta de dados de empresas que atuam em solo norte-americano. Mas realizar espionagem em países estrangeiros é a própria missão da NSA. Segundo documentos vazados por Edward Snowden, o ex-colaborador terceirizado da agência que vazou as informações sobre a espionagem, a NSA rotineiramente comprometeu equipamentos de rede em outros países para instalar grampos.
Descobrir a origem de ataques desse tipo não é uma tarefa simples.
O governo tem destacado a importância de uma legislação local. Na semana passada, voltando a postar no Twitter, a presidente Dilma Rousseff reforçou o desejo do governo de proteger os internautas brasileiros e apontou garantias presentes no Marco Civil da Internet para aumentar a privacidade.
Mas a legislação local em nada altera as ações da NSA, regidas tão somente pela legislação norte-americana.
Legislação local também não altera os compromissos que empresas norte-americanas têm com seu governo e com os governos de outros países em que atuam. Da mesma forma que o Brasil obriga essas empresas a respeitarem leis brasileiras e a cederem dados solicitados pela Justiça daqui, independentemente do local em que esses dados estejam armazenados, por que o entendimento das autoridades norte-americanas seria diferente? Eles também podem pedir dados armazenados por empresas norte-americanas em qualquer lugar do mundo, e têm um tribunal secreto para isso (que é justamente para não ficarmos sabendo).
É preciso ter cuidado para não levantar uma bandeira com dois pesos e duas medidas.
Por esse motivo, por mais positivas que essas medidas possam ser economicamente, trazendo investimento de tecnologia para o Brasil, é difícil imaginar ganhos de privacidade. A viabilidade da medida também é discutível, já que se empresários não investirem em novos centros de dados no Brasil o resultado será um encarecimento dos serviços. Como os preços brasileiros já não são nada convidativos quando comparados com os de outros países, o resultado seria uma redução no número de serviços disponíveis para brasileiros, especialmente por empresas menores.
Glenn Greenwald, que escreveu reportagens com base nos documentos vazados por Snowden, levantou a ideia de que Brasil e Argentina deveriam criar uma "internet própria". O detalhe, no entanto, é o seguinte: uma “internet própria” não é internet. É só uma rede isolada. Se ela está ligada a outras redes, é a internet e não é “própria”. Certamente, isolar partes da rede pode ser útil para a segurança, mas não é isso que se deseja para o crescimento da internet como meio de comunicação global e acessível a todos.
No fim das contas, a espionagem é um problema político internacional. Não vai ser resolvido com tecnologia ou legislação, mas apenas com política. A proposta brasileira de buscar um controle mais global da internet, na Organização das Nações Unidas (ONU), pode ser um caminho. Mas se os Estados Unidos leram a correspondência eletrônica do alto escalão do governo, porém, o problema não é político – é obrigação do governo cuidar de si mesmo. Podemos até reclamar que os EUA são um “aliado” do Brasil e não devia ter feito isso; mas isso não significa que não temos inimigos.
Mesmo com tantos esforços para corrigir esse erro grotesco do nosso governo, isso não vai parar do jeito que nós queremos, pois a espionagem é uma realidade e como já disse: Quem detêm o conhecimento, está à frente e detêm o poder. O que devemos fazer é entender que nem tudo que fazemos deve ser postado, primeiro temos que nos policiar para depois cobrar. Sempre seremos observados, estejamos na rede ou não.